• Julio Costa Netto - Dissidências Espíritas e Doutrinas Correlatas (2018)

    Julio Costa Netto - Dissidências Espíritas e Doutrinas Correlatas (2018)

    Auteur : Julio Costa Netto
    Titre : Dissidências Espíritas e Doutrinas Correlatas
    Éditions : 2018

     

     

     

    18. ANTOINISMO: A VIA DA CURA

           18.1. HISTÓRICO:

                   Louis-Joseph Antoine nasceu em 7 de junho de 1846, filho caçula de uma família numerosa, pobre e católica, na localidade de Mons-Crotteux (hoje Mons-lez-Liège), província de Liège, na Bélgica. Criado no catolicismo, foi mineiro e siderúrgico. Casou-se em 1873 com Jeanne Catherine Collon, tentou a sorte primeiro na Alemanha, depois em Varsóvia, mas sem êxito, antes de regressar permanentemente a Jemeppe-sur-Meuse (1884), onde viveria até o desencarne. O contato com a obra de Allan Kardec e a morte de um filho em 1893 levou-o a romper com a Medicina oficial, com a Igreja Católica e a formar um grupo espírita, Os Vinhateiros do Senhor. Três anos depois, escreveu um primeiro livro, Petit Catechisme Spirite, explicando seus pontos de vista e descobriu que era médium curador, o que lhe trouxe grande número de seguidores, bem como problemas com a Justiça.

    Figura 11: Símbolo do Antoinismo

     

    Figura 11: Símbolo do Antoinismo
    (Fonte: Site Louis Antoine et l'antoinisme.1910-2010) 

     

                   Aos poucos, vai ganhando entre os seus o carinhoso apelido de Pai. Em 1906, passa a preconizar um novo espiritualismo. No ano seguinte, oficializa seu afastamento do Espiritismo, cria a sua própria religião e escreve mais três livros explicando-a: La révélation d’Antoine le généreux (1909), Le couronnement de l’oeuvre révélée (1909) et Le développement de l’enseignement du Père (1910). Em 15 de agosto de 1910, consagra o primeiro templo antoinista em Jemeppe-sur-Meuse, data esta que passou a ser considerada a de início da nova religião.

     

                   Desencarna em 25 de junho de 1912, e sua esposa, por ele nomeada previamente sua sucessora, formalizou o direcionamento do culto à pessoa de seu marido. Aos poucos, também ela ganhou a alcunha afetuosa de Mãe. Com o tempo, a doutrina se expandiu de modo que atualmente há um ramo francês e um belga.

    18.2. QUESTÕES DIVERGENTES:

           18.2.1. Consciência x Inteligência:

                   O Antoinismo mescla elementos católicos, espíritas e orientais. Apresenta uma concepção dualista: o mundo espiritual, governado pela lei de Deus, que é a consciência; e o mundo material, puramente ilusório e criado por nossa imaginação através da inteligência. Para explicá-la, adota uma interpretação sui generis da doutrina do pecado original:

    Adão começou a seguir Eva, que depositou sua confiança em uma serpente, símbolo da matéria. Ao imaginar a materialidade do mundo físico, abandonou a consciência divina em que viveu e produziu as ideias do bem e do mal. A árvore do conhecimento do bem e do mal na Bíblia é redefinida como a árvore do conhecimento da vista do mal [símbolo do Antoinismo] (DERICQUEBOURG, 2002 apud WIKIPEDIA).

                   Na Revelação dos Dez Princípios de Deus pelo Pai, lemos:

    Sexto Princípio:

    Quando quiserdes conhecer as causas
    Dos vossos sofrimentos,
    Que suportais sempre com razão,
    Vós a encontrareis na incompatibilidade
    Da inteligência com a consciência,
    Porque elas são à base dos termos de comparação.
    Não podeis experimentar o menor sofrimento
    Que nos seja para vos fazer notar
    Que a inteligência é oposta à consciência,
    Eis o que é preciso não ignorar.

    Sétimo Princípio:

    Esforçai-vos por vos compenetrar
    De que o menor sofrimento é devido à vossa
    Inteligência que quer sempre possuir mais;
    Ela se faz um pedestal da clemência,
    Querendo que tudo lhe seja subordinado.
    (Louis Antoine et l´Antoinisme, 2015)

           18.2.2. Panteísmo:

                   O ser humano mescla ambos os mundos em si por ter consciência, originária de Deus, e um corpo físico, consequência de sua inteligência que fá-lo acreditar na realidade do mundo material. Através da reencarnação, a alma vai se depurando e se libertando das ilusões criadas pela inteligência, até que se liberta do ciclo de morte e renascimento e se integra à Divindade, semelhante ao conceito hindu de samsara1.

           18.2.3. Laissez-faire

                   Não encontrei uma palavra melhor do que esta francesa, que tem o significado de “deixa fazer” ou “deixa acontecer”, para descrever a posição desta doutrina, que valoriza de tal forma o livre arbítrio individual que rejeita o proselitismo, a doutrinação das crianças e recusa-se a se posicionar em questões como divórcio, aborto e sexualidade. Na Revelação dos Dez Princípios de Deus pelo Pai, o Segundo Princípio diz:

    Não creias naquele que vos fale de mim
    E cuja intenção seja de vos converter.
    Se respeitais toda crença,
    E aquele que não a tem,
    Sabeis, apesar da vossa ignorância,
    Mais do que ele vos poderia dizer. (Louis Antoine et l´Antoinisme, 2015)

           18.2.4. Trabalho de Cura:

                   O culto antoinista é bastante simples e grandemente voltado para cura dos males do corpo, atribuídos à imaginação, falta de fé e excessiva confiança na ciência. Limita-se à transmissão de fluidos aplicados coletivamente por meio de orações, seguido da leitura de uma página de Antoine. Há também atendimento individualizado para os que o desejam, mas não há prescrição de nenhum tipo de medicação, nem magnetização (não há passes à maneira espírita) nem psicoterapia. Na verdade, para o Antoinismo, “oração e a observância da 'Lei Moral' são os reais remédios para a prova”, e o curador antoinista deve ser “um homem de Deus, um ser de espiritualidade que ajuda a restaurar "a saúde da alma" pelo único efeito de seu amor e não pelos poderes da mente ou do corpo”, por isso não se vale de qualquer técnica nem recebe nenhum tipo de treinamento. (DERICQUEBOURG, 1993) No entanto, quando necessário, bons fluidos podem ser transmitidos pelos uniformes dos curadores, por retratos do Pai ou escrevendo os nomes e colocando-os numa caixa específica para este fim (WIKIPÉDIA).

           18.2.5. Ritualística:

                   Existe rituais de batismo de crianças, casamentos e funerais, mas são de extrema simplicidade, não têm um sentido de sacramento, não há qualquer obrigatoriedade mesmo para os fiéis e visam apenas a elevação do pensamento em eventos importantes na vida dos interessados.

           18.3. ANÁLISE:

                   O panteísmo desta religião faz lembrar o Divinismo, mas de resto este culto singular tem uma postura bastante tolerante, não proselitista, não dogmática e não sectária, pelo que acaba sendo difícil estimar o real número de seguidores, já que muitos são ao mesmo tempo espíritas, católicos ou espiritualistas em geral, sem qualquer tipo de conflito de fé. Begot (2000) comenta a respeito que um grupo de crentes considera o Pai como um reflexo da face de Deus; os católicos antoinistas o têm na conta de alguém como o próprio Cristo; os espiritualistas em geral o admiram como alguém altamente espiritualizado, como o Buda. Louis Pauwels assim define seus objetivos: "ajuda mútua, solidariedade espiritual e humana, disponibilidade e recepção".

                   Autores como BEGOT e DERICQUEBOURG chamam a atenção para a semelhança entre esta doutrina e sua quase contemporânea Ciência Cristã2. Ambas principiam por um protesto contra a Medicina oficial de seu tempo. Segundo BEGOT (1997):

    No caso da Ciência Cristã e do Antoinismo, a doença era um meio de cristalizar os conflitos decorrentes da racionalização da instituição médica, o alto custo dos cuidados médicos e a progressiva secularização interna das denominações religiosas (isto é, o lugar pobre dado às práticas de cura).

                   Inicialmente, havia uma atitude francamente hostil à Medicina, do tipo “ou ela ou eu”:

    A medicina é baseada nas ciências da matéria, é portanto "inteligência", a cura pela fé é baseada na "consciência divina". As causas da doença e o modus operandi do tratamento são em ambos os casos radicalmente diferentes. Um médico que orasse por seus pacientes faria um compromisso inadequado. Ou ele tem confiança suficiente na oração e desiste dos remédios. Ou, ele tem fé na virtude dos medicamentos e sua oração está errada porque tem a impressão de uma dúvida111 (DERICQUEBOURG, 1993).

                   Hoje, a postura é tolerante.

    Não seria apropriado forçá-lo a escolher entre medicina e fé, ou pressioná-lo para que primeiro recorra à cura espiritual. Quando um paciente pergunta se ele deve consultar um médico, ele é aconselhado positivamente e a orar "para que o médico seja iluminado para tratá-lo" ou que ele tenha "a inspiração para encontrar um bom médico"112 (DERICQUEBOURG, 1993).

                   Interessante notar que, embora a primeira seja uma dissidência do Protestantismo e a segunda do Espiritismo, ambas negam a realidade do mundo material, se opõe ao uso de remédios e têm na oração a principal ferramenta terapêutica.

    (1)      Ciclo de morte e renascimento: por ignorância do verdadeiro eu, a alma é levada a crer na realidade do mundo material, e deverá nascer e renascer até que se liberte desta crença e quebre o ciclo.

    (2)      Movimento religioso fundado por Mary Baker Eddy, em 1866, na cidade de Boston, Massachusetts (Estados Unidos).


  • Commentaires

    Aucun commentaire pour le moment

    Suivre le flux RSS des commentaires


    Ajouter un commentaire

    Nom / Pseudo :

    E-mail (facultatif) :

    Site Web (facultatif) :

    Commentaire :